Fenômeno é uma palavra que deveria ser usada com mais parcimônia. A sua aplicação, em determinados casos, soa falsa, sem valor. Principalmente quando artistas e esportistas novatos e que ainda não provaram suas qualidades são classificados como tal.
O dicionário Houaiss, por exemplo, explica que fenômeno é um “fato raro e notável”. E desse tipo, há poucos, principalmente na história recente da música brasileira. Um dos mais emblemáticos, porém, é a banda Calypso. Surgida numa das capitais mais distantes e pobres do país, Belém do Pará, o grupo liderado por Joelma e Chimbinha tem realizado sucessivos feitos improváveis desde sua fundação, em 1999.
Investindo numa sonoridade que bebe em fontes como a guitarrada, rock, calypso, zouk, cúmbia, lambada e forró, o grupo nunca encontrou gravadora ou empresário que apostasse nessa miscelânea. Resultado: resolveu trilhar o caminho da fama na independência, impulsionado pelas inovadoras estratégias de marketing de Chimbinha.
Sim, Chimbinha, o famoso músico de estúdio que participou da gravação de mais de mil discos e que só teve a oportunidade de estudar até a sexta série, é o homem por trás de um dos maiores êxitos mercadológicos da música nacional atual. Em entrevista exclusiva, ele comenta detalhes da sua carreira e divulga planos para o futuro. (Por Helder Maldonado).
SUCESSO!: Quais são suas principais influências?
Chimbinha: Sou um viciado em música. Ouço muitos ritmos, inclusive alguns poucos conhecidos e ouvidos no Brasil como os africanos e caribenhos. Além disso, gosto demais das guitarradas. Gostaria de destacar Mark Knopfler, do Dire Straits, como grande ídolo.
SUCESSO!: Acredita que o sucesso da Banda Calypso ajudou o sudeste e o sul a enxergarem a música do Pará ou isso ainda está longe de acontecer?
Chimbinha: Sem dúvida alguma. Os artistas do Norte e Nordeste enfrentavam muitas dificuldades para transpor barreiras antes do aparecimento e consolidação da Banda Calypso. Depois da Banda Calypso “acontecer” para o Brasil, a mídia e os críticos da região Sul e Sudeste passaram a enxergar o país como um todo, incluindo o Norte e o Nordeste como fonte de cultura.
SUCESSO!: A banda Calypso é um fenômeno autossuficiente. Depois disso, vocês acabaram assinando com uma grande gravadora. Por que mudaram o rumo no meio do caminho?
Chimbinha: Nunca assinamos com uma gravadora. Desde o início fomos independentes. A única coisa que aconteceu é que, no disco “Volume 10″, fomos distribuídos pela Som Livre. Mas o fonograma é todo da banda.
SUCESSO!: Ainda hoje vocês distribuem discos nos shows e para as rádios de poste?
Chimbinha: Não distribuímos mais gratuitamente para o público. Comercializamos o CD original, em box de acrílico por um valor muito acessível e bastante popular. Esse sempre foi o diferencial da Banda Calypso. Quanto às rádios, divulgamos em todas, sem distinção. Fornecemos CDs e brindes personalizados para sorteio para as emissoras.
SUCESSO!: O estilo calipso já não está tão em alta. Hoje é o sertanejo que comanda as rádios. Quais estratégias adotadas por você para se manter sempre em evidência?
Chimbinha: Primeiramente, temos um grande público que curte nosso trabalho. Fazemos músicas que tocam o coração das pessoas, com letras e melodias bonitas. Música boa é boa, independente do ritmo.
SUCESSO!: É verdade que você mantém um ótimo relacionamento com radialistas, o que ajuda sua música sempre ser tocada sem o pagamento de jabá?
Chimbinha: Com certeza. Nunca viramos, nem viraremos as costas para quem apoiou a banda Calypso em seu início. E agradecemos aos nossos fãs por ligarem, pedirem as músicas e fazerem da banda Calypso uma das mais tocadas em todo o país.
SUCESSO!: Você estudou apenas até a sexta série. Como surgiu essa consciência administrativa com a qual você toca sua carreira: foi da experiência como músico ou da necessidade vital?
Chimbinha: Da necessidade. No início eu não me preocupava com lucros e resultados financeiros. Sempre toquei por amor à música. Mas, com o passar do tempo e com a constituição da minha família, não pude pensar só em mim. Tive que ganhar dinheiro para sustentar a casa.
SUCESSO!: Você tem uma história como músico de estúdio. Ainda hoje faz colaborações em discos de outros artistas?
Chimbinha: Sim, bastante. Nunca deixarei o estúdio. Foi lá que comecei e que começou todo o trabalho da banda Calypso. Amo o estúdio e adoro ajudar novos artistas. Se me chamar, eu vou.
SUCESSO!: Alguns artistas paraenses e de estados vizinhos jamais conseguiram fazer sucesso no Sul e no Sudeste. Por estar em melhor situação que eles, nunca pensou em financiar um disco para promovê-los?
Chimbinha: Já lançamos vários artistas como, por exemplo, Edílson Moreno, Banda Bis, Amor Perfeito, Kim Marques, Diogo e outros. Além disso, temos vontade de fazer um disco com “Mestres da Guitarra”, mas eles estão presos a contratos com empresários que impossibilitam a realização dessa nossa vontade. E existem outros movimentos no Pará que não fazem parte do nosso ritmo. Um exemplo é o Tecnobrega.
SUCESSO!: Dificilmente músicos populares conquistam o respeito de artistas da MPB e do rock. E você já tocou com gente como Hebert Vianna, Nando Reis e Caetano Veloso. Para você, por que aconteceu essa aproximação?
Chimbinha: Pelo nosso som ser muito verdadeiro. Ele é único no Brasil. E acredito que todos eles viram que a Banda Calypso não é só comércio. Viram que fazemos um som regional que ultrapassou barreiras e conquistou o Brasil.
SUCESSO!: Como é gerenciada a carreira da banda hoje: você é responsável por tudo ou delega as atividades?
Chimbinha: Delego muitas funções. Conto com toda a estrutura do nosso escritório – a Luan Promoções e Eventos – que gerencia toda a parte artística e administrativa. Ela cuida tanto do comercial (venda de shows, marca e licenciamentos) como de todos os cuidados com o nosso pessoal – parte que eu e a Joelma nos preocupamos muito. Além disso, temos funcionários que tomam conta de toda nossa estrutura (a JC Shows) e da editora (a JC Editora).
SUCESSO!: Na sua opinião, o download ilegal ajuda ou atrapalha a divulgação de produtos?
Chimbinha: Para artistas novos, ajuda. É uma forma mais rápida e acessível para quem não tem estrutura de lançar seus novos trabalhos. Porém, atrapalha quem já tem nome no mercado, pois dificulta a venda de CDs e DVDs.
SUCESSO!: Hoje vocês já distribuem CD na compra de um ingresso?
Chimbinha: Ainda não. Somos comprometidos com nossos parceiros compositores e respeitamos muito os direitos autorais. E não há como repassar esses direitos se dermos CDs de graça para o público.
SUCESSO!: Nem você e nem a Joelma pensam em gravar um disco solo novamente?
Chimbinha: Penso, sim. Um dia gravarei um CD só com minha guitarra.
SUCESSO!: Você acredita que a aprovação da PEC da música ajudaria a indústria fonográfica ou essa já é uma causa perdida?
Chimbinha: Sim, ajudaria para combater a pirataria. Mas o problema é que hoje os novos artistas que entram no mercado não fazem música. O que existe é cópia de música. Uma banda de forró pega uma música do sertanejo do Sul e grava em ritmo do forró – ou vice e versa. As rádios deveriam fiscalizar isso, tocando só as versões originais. Além disso, há a distribuição gratuita de CDs em parada de ônibus, porta de shows e de faculdades também. Isso acaba com a venda de discos mesmo.
Fonte: Sucesso entrevista
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